Os setores estimam que a reoneração da folha, a partir de janeiro 2021, na fase mais aguda de “ressaca” do impacto da pandemia do coronavírus na economia pode custar entre 500 mil e um milhão de empregos, segundo o presidente executivo da
Associação Brasileira da Indústria de Máquina e Equipamentos (Abimaq) , José Velloso.
Indústria têxtil é um dos setores ainda beneficiados pela desoneração da folha. Foto: Cedro Têxtil/Divulgação
A mobilização junto aos senadores e deputados já começou ontem após a confirmação do veto com a publicação do Diário Oficial da União . Um documento preparado pela coalizão está sendo distribuído para contestar a análise jurídica da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PFGN) , que embasou o veto do presidente. A expectativa é que o presidente do Congresso , Davi Alcolumbre (DEM-AP) , coloque rapidamente em votação. O assunto já foi discutido em reunião de líderes do Senado .
A desoneração termina no fim de 2020 , e sua extensão enfrentou resistências na equipe econômica, que prefere discutir uma política geral de estímulo à geração de empregos para a pós-pandemia. Há uma preocupação também de não tirar espaço no teto de gasto (regra que impede o crescimento das despesas acima da inflação) no ano que vem. Entre os setores que ainda são beneficiados pela desoneração da folha estão call centers, tecnologia da informação, construção civil, calçados, indústria têxtil e comunicação.
A equipe do ministro da Economia , Paulo Guedes , recomendou o veto alegando que a medida fere a Lei de Responsabilidade Fiscal por não apresentar compensação pelo custo da desoneração, estimado em R$ 10 bilhões.
Para vetar a proposta, a Presidência justificou que “as medidas acarretam renúncia de receita, sem o cancelamento equivalente de outra despesa obrigatória e sem que esteja acompanhada de estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro”. A prorrogação foi incluída pelos parlamentares na Medida Provisória 936 , editada em abril, com o objetivo principal de criar condições para que empresas e empregados possam garantir a manutenção dos empregos durante a crise econômica gerada pela pandemia. A lei autoriza a suspensão de contratos de trabalho e a redução de jornadas e salários.
O presidente da Abimaq disse ao Estadão que, em reunião no último dia 26, Guedes disse que era favorável à desoneração da folha ao afirmar que não tinha intenção de vetar o texto. O ministro alegou, no entanto, que havia restrições da PGFN. Representantes dos 17 setores se reuniram depois com a PGFN para apresentar a defesa da prorrogação, mas não tiveram sucesso. A recomendação do veto foi aceita pelo Palácio do Planalto.
A estratégia agora, segundo Velloso, é mostrar aos parlamentares o equívoco dos argumentos da PGFN, que alegou também que a prorrogação era “matéria estranha” ao conteúdo da MP. Para Velloso, a MP tratava de medidas para emprego e a prorrogação garante a sua preservação. “Não é um jabuti”, justificou, em entrevista ao Estadão.
O presidente executivo da Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom), Sergio Paulo Gallindo , criticou a decisão do presidente depois da longa interlocução com o Congresso e o acordo na hora da votação que reduziu de 24 meses para 12 meses o prazo da prorrogação. “Estamos a seis meses do final do ano. É um tempo curto para um debate tão complexo”, ponderou. “A prorrogação daria mais tranquilidade para os investidores até lá”, disse.
O presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecções (Abit), Fernando Pimentel, disse que num momento como agora, com a pandemia, não é hora de “jogar mais custo” para as empresas. “Diante do quadro em que estamos vivendo, são setores que empregam milhões de pessoas. Só no setor têxtil trabalha 1,5 milhão de pessoas”, disse.
A desoneração garante para o setor uma redução de custo entre R$ 270 milhões e R$ 300 milhões. Segundo Pimentel, “esse é um mecanismo que já mostrou o seu valor. Para ele, é um equívoco a alegação de que não há previsão para bancar o custo em 2021. O relator da MP na Câmara, Orlando Silva (PCdoB) , ressaltou que a prorrogação da desoneração foi votada por quase unanimidade nas duas Casas num grande entendimento político para a preservação de empregos. “No auge do coronavírus vamos onerar empregos?”, criticou. Silva avaliou que há ambiente político para a derrubada do veto.
Governo quer tema na reforma tributária
O ministro da Economia , Paulo Guedes , prefere discutir a desoneração da folha na reforma tributária. Promessa de campanha do presidente Jair Bolsonaro , a implementação de uma desoneração ampla da folha enfrenta, no entanto, dificuldades por conta das restrições orçamentárias para bancar a retirada de encargos pagos hoje pelas empresas.
Para lideranças doCongresso , por trás do veto à prorrogação da desoneração da folha estaria a tentativa de Guedes de buscar ambiente político para a criação de um imposto sobre as transações digitais, nos moldes da antiga CPMF , como “salvação” de empregos depois da pandemia da covid-19.
Nos últimos dias, o ministro voltou a falar no tributo, ao defender que não haja a interdição do debate no Congresso. A proposta, porém, enfrenta forte resistência no Congresso.
Uma das alternativas é começar a fazer a desoneração da folha de forma gradual. A equipe econômica prepara um programa para desobrigar empresas de pagar impostos sobre a folha na contratação de jovens e pessoas que estão sem carteira assinada. Essa desoneração inicial poderia ser bancada com recursos do Sistema S. Assim, o governo avalia que ganharia tempo para trabalhar melhor no Congresso a possibilidade de emplacar a ideia do novo tributo.