por: Cristina De Luca

14 de agosto. Nesta data, há dois, era sancionada a Lei Geral de Proteção de Dados. E exatamente a partir de hoje, 14 de agosto de 2020, ela deveria estar entrando em vigor. Deveria…
No lugar da vigência, o que temos hoje é muita incerteza.
“Está claro para mim que há uma decisão política de obstruir a vigência da lei”, afirmou hoje o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), ao participar de uma live organizada pelo DataPrivacy Brasil.
Ele havia acabado de sair de uma reunião na qual 60 associações empresariais reivindicaram a votação da Medida Provisória 959, nos termos em que foi encaminhada pelo governo, adiando a vigência da LGPD para maio de 2021.
“Fui franco. O argumento de que a LGPD não pode entrar em vigor porque não tem regulamentação, depois da sua sanção, é um argumento cretino, com perdão da palavra, pouco delicada. E também não dá para colocar na conta da pandemia. Nós tivemos todo o ano passado para fosse editado um decreto regulamentando a lei. A meu ver há uma tentativa politica de obstruir a aplicação da lei. Não me peçam cumplicidade com uma atitude deste tipo”, disse Orlando, que é uma espécie de termômetro da Câmara sobre temas relacionado à proteção de dados, desde que relatou o PL que deu origem à lei.
O parlamentar não chegou a dizer quais associações estavam presentes, nem de quais setores. Mas sabe-se que entidades dos setores de comunicação, incluindo a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert) e a Associação Brasileira de Rádio e Televisão (Abratel), e de tecnologia _ que tanto lutou pela aprovação da lei no passado, através da Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom) _ estão entre as que passaram a defender o adiamento da vigência para o ano que vem. Por motivos diferentes.
Muitas empresas de comunicação estão atrasadas na adequação de suas práticas de tratamento de dados. já as empresas de tecnologia estão preocupadas com a insegurança jurídica que a falta que da Autoridade Nacional de Proteção Dados representará na aplicação da Lei.

“Já estão adiadas as sanções [para agosto de 2021]. Agora querem adiar a vigência. OK, mas então vamos votar a PEC 17 e vamos regulamentar a lei”, provoca o deputado Orlando Silva, hoje relator dessa proposta de emenda constitucional que além de incluir a proteção de dados pessoais entre os direitos fundamentais dos brasileiros, também determina que a ANPD seja uma “entidade independente, integrante da administração pública federal indireta, submetida a regime autárquico especial” e deixe de estar vinculada à presidência da República, como acontece hoje.
“Com delicadeza eu chamei a atenção [dos presentes à reunião] que se a MP for aprovada nos termos que o governo propôs, nós vamos adiar [aa vigência da LGPD] para maio do ano que vem e, pode anotar aí, em janeiro do ano que vem o governo vai começar um movimento para editar uma nova medida provisória para adiar a vigência para 2022”, alertou Orlando.
Na opinião do deputado há uma incompreensão, por parte do governo e de alguns setores da sociedade, da importância econômica da plena vigência da LGPD.
“O principal adversário da ANPD é o ministro da Economia. Na visão dele se quer criar mais uma burocracia. Mais uma estrutura. Mais um órgão [na administração pública]. Que é coisa de estatista e da esquerda. Ele já disse isso em uma reunião fechada. É claro que é um ministro analógico, que não entende sequer o que é a economia digital, e a relevância para a economia do Brasil”, acusa o deputado. “No ambiente de crise que estamos vivendo seria muito importante que o Brasil fosse exportador de serviços nessa área. Nós temos empresas com capacidade instalada que poderiam exportar serviços”, pondera.
Para o parlamentar, “votar a MP 959, pura e simplesmente, significa defender posição equivocada do governo”. Por isso, Orlando Silva faz questão de deixar claro que, nesse momento, trabalha para que a MP 959 não seja aprovada. Para que o Supremo Tribunal Federal se debruce sobre o descumprimento da lei por parte da Presidência da República, que já deveria ter instaurado a ANPD. E para que o parlamento avance na aprovação da PEC 17, hoje aguardando sua votação pelo Plenário da Câmara.

O que está em jogo?

A MP 959 perde a validade a partir de 26 de agosto, se não for aprovada pelo Congresso. O que faria a LGPD entrar em vigor no dia seguinte, retroativa à 17 de agosto. O congresso teria que publicar um decreto determinando as regras para esse período de ‘limbo’.
Dias atrás, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, chegou a afirmar que colocaria a MP em votação. Logo depois, seu relator, deputado Damião Feliciano (PDT/PB), apresentou o seu parecer, retirando do texto o artigo que jogava a vigência da LGPD para maio do ano que vem. Desde então, o Congresso virou palco de articulações diversas.
A sociedade civil defende a imediata entrada em vigor da LGPD. Muitos parlamentares também. Mesmo sem a ANPD estar em operação (o que para muitos é um problema). E sem que muitas empresas tenham feito o dever de casa para estar em conformidade com a legislação.
Por outro lado, muitas empresas estão contando com o início da vigência agora para agosto. Nas últimas semanas, começaram a pular as notificações a respeito de mudanças de políticas de uso de vários aplicativos. Tem gente grande acelerando o processo de conformidade. Em especial, as BigTechs.

 

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

 

Fonte: Blog Porta 23
https://porta23.blogosfera.uol.com.br/2020/08/14/dois-anos-da-aprovacao-da-lgpd-e-a-data-de-vigencia-ainda-esta-em-debate/

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