Brasília, 3 de dezembro de 2024, às 17:00h – Posicionamento do setor produtivo
sobre as regras de direitos autorais do Projeto de Lei n. 2338/2023, que tramita
perante a Comissão Temporária de Inteligência Artificial do Senado, e suas
consequências.

 

Excelentíssimos Senadores e Senadoras da Comissão Temporária Interna
sobre Inteligência Artificial do Senado Federal

O desenvolvimento da Inteligência Artificial (IA) tem o potencial de revolucionar a
sociedade e a economia brasileiras, com impactos positivos em áreas como saúde,
educação, agronegócio, meio ambiente e produtividade da indústria em geral.
Entretanto, para que a IA atinja seu potencial máximo é crucial que o Brasil adote
regras equilibradas, que não abram mão da necessária proteção de direitos e, ao
mesmo tempo, estimulem a inovação e o desenvolvimento.

A Comissão Temporária Interna sobre Inteligência Artificial do Senado Federal tem
feito um importante trabalho de diálogo com todos os setores da sociedade. É
possível observar a trajetória de amadurecimento do Projeto de Lei 2338 rumo ao
necessário equilíbrio entre os vários aspectos tocados pelas tecnologias
emergentes de IA.

Entretanto, a versão atual do PL 2338 ainda não encontrou o mais adequado
equilíbrio entre a proteção de direitos de autor e conexos e a criação de um
ambiente amigável à inovação para possibilitar o treinamento de modelos de IA sem
inviabilizar a proteção dos titulares de direitos.

A última versão do PL 2338 apresenta um conjunto de regras que pode
inviabilizar o desenvolvimento da IA no Brasil. Entre outros pontos, a redação
atual inviabiliza o treinamento de sistemas de IA sempre que houver finalidade
comercial ao exigir o pagamento pelo aprendizado computacional de conteúdos
(inclusive conteúdos protegidos) e a divulgação dos conjuntos de dados nos quais
os sistemas de IA foram treinados.

Tais obrigações, na prática, inviabilizam o treinamento de novos modelos locais de
IA e o aprimoramento de modelos existentes e, com isso, irão deteriorar a qualidade
de todos os sistemas que dependem desses modelos para performar tarefas que,
aos poucos, já fazem parte do cotidiano dos brasileiros e de todo o setor produtivo.
O treinamento de sistemas de IA é fundamental para que qualquer pessoa possa,
com qualidade, realizar tarefas como: revisar o texto de um e-mail ou documento;
dialogar com um sistema de atendimento que irá filtrar e direcionar melhor e mais
rapidamente suas demandas junto a uma empresa; ler, pesquisar e compreender de
maneira mais ágil grandes volumes de informação, ajudando na pesquisa científica
e na elaboração de trabalhos complexos.

Neste contexto, os usos dos referidos modelos se consolidaram em diferentes áreas
do conhecimento, incluindo a academia, indústria, e até mesmo a prestação de
serviços públicos de qualidade para a população.

Para o agro brasileiro, que vem reforçando o seu protagonismo global pela
eficiência e melhoria na gestão dos processos produtivos, uma queda na oferta de
soluções inovadoras representará um enorme detrator de competitividade. Com as
restrições previstas no PL, os modelos de IA serão cada vez menos treinados no
Brasil e no português brasileiros, resultando não apenas em uma menor quantidade
de ferramentas de tecnologia disponíveis, mas também em ferramentas menos
representativas da realidade brasileira, resultando em menor eficiência na pesquisa
e desenvolvimento científico.

Além disso, o PL 2338 não acompanha as tendências internacionais que buscam
alcançar um equilíbrio entre a proteção dos direitos autorais e o desenvolvimento da
IA. Países como Singapura e Japão permitem amplamente o treinamento de
modelos e sistemas de IA. A União Europeia, por sua vez, adotou regras mais
flexíveis que permitem análise computacional de obras disponíveis publicamente
para viabilizar o treinamento de IA, reconhecendo a importância de fomentar a
inovação nesse campo, ao mesmo tempo em que garante que os detentores de
direitos possam indicar, por meios técnicos, que não permitem o treinamento em
suas obras.

A proposta de legislação brasileira, dessa forma, poderá isolar o Brasil no
desenvolvimento da IA, além de impactar investimentos em infraestrutura digital
(data centers e toda a cadeia de produtos e serviços necessária, como a geração de
energia renovável que poderia ser fornecida para datacenters de aprendizado de
máquinas). Haverá um efeito em cascata na geração de empregos no setor de
tecnologia, culminando na perda de competitividade do país diante do cenário global
de IA. Por fim, sem o aprendizado de máquinas (machine learning), como
consequência das regras propostas no PL 2338, ficará inviabilizado o
desenvolvimento de modelos com dados diversos e representativos da realidade
brasileira.

Essas consequências contrariam os objetivos previstos do Plano Brasileiro de
Inteligência Artificial (PBIA), um conjunto de políticas públicas necessárias e
ambiciosas que prevê a valorização da cultura brasileira por meio do treinamento de
modelos no Brasil.

É importante destacar, por fim, que a possibilidade de treinamento de modelos de IA
não inviabiliza o trabalho criativo e muito menos a arte. Pelo contrário, a IA pode
abrir novas possibilidades de criação e, num futuro próximo, gerar novas linhas de
receita para detentores de direitos.

Diante do exposto, as entidades que subscrevem esta carta solicitam aos
Senadores membros da Comissão Temporária Interna de Inteligência Artificial, ao
invés de aprovarem o regime mais rigoroso do mundo no que tange aos
direitos autorais aplicados ao treinamento de modelos de IA, que busquem uma
solução mais amigável à inovação, que compatibilize a proteção de direitos autorais
e conexos com o desenvolvimento da tecnologia, a inovação e a produtividade.

Nesse sentido, solicitamos a supressão dos pontos relativos a direitos autorais, que
devem ser discutidos separadamente ou, alternativamente, o reconhecimento da
legalidade do treinamento de modelos e sistemas de IA, ressalvando a possibilidade
de que titulares possam restringir o uso de suas obras (opt-out) por sistemas de IA.
Acreditamos que o Brasil tem a oportunidade de se tornar um líder no
desenvolvimento da IA, desde que adote regras que permitam a inovação e a
pesquisa nesse campo. Contamos com o apoio dos Senadores para garantir que o
Brasil não perca essa oportunidade.

Subscrevem esta carta:

ABAG – Associação Brasileira do Agronegócio
IBD – Instituto Brasileiro Digital
ABES – Associação Brasileira das Empresas de Software
ABISOLO – Associação Brasileira das Indústrias de Tecnologia em Nutrição Vegetal
ABRABOR – Associação Brasileira de Produtores e Beneficiadores de Borracha Natural
ABRASEM – Associação Brasileira de Sementes e Mudas
ABRIA – Associação Brasileira de Inteligência Artificial
ABStartups – Associação Brasileira de Startups
ABDC – Associação Brasileira de Data Center
Adial – Associação Pro-Desenvolvimento
AMA BRASIL – Associação dos Misturadores do Brasil
Amcham Brasil – Câmara Americana de Comércio para o Brasil
Anapa – Associação Nacional dos Produtores de Alho
Andav – Associação Nacional dos Distribuidores de Insumos Agrícolas e Veterinários
ASSESPRO – Federação das Associações das Empresas Brasileiras de Tecnologia da
Informação
Brasscom – Associação das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC)
e de Tecnologias Digitais
Câmara E-Net – Câmara Brasileira da Economia Digital
CLB – CropLife Brasil
FENAINFO – Federação Nacional das Empresas de Informática
IBD – Instituto Brasileiro Digital
MBC – Movimento Brasil Competitivo
MID – Movimento Inovação Digital
SRB – Sociedade Rural Brasileira

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