O fim da desoneração sobre a folha de pagamento deve ter impacto mais forte sobre os produtores de alimentos processados e o setor de aves e suínos, em especial a BRF, a mais exposta do setor, avalia o Credit Suisse. A análise coincide com a do Citi, cujo relatório aponta o setor de aves como o mais afetado. Indústrias das áreas têxtil, vestuário, calçados e eletrônicos temem o impacto sobre os custos.
Se a reoneração não for repassada aos clientes, aponta o Credit, é provável que os lucros da BRF sofram impacto de R$ 200 milhões em base anual – equivalente a 5% do lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda, na sigla em inglês) previsto para 2017.
A JBS deve sofrer em especial por causa do impacto na Seara, mas o Credit avalia que esse efeito deve ser “relativamente menor”, já que esta divisão representa menos de 15% do Ebitda consolidado.
O relatório do Citi destaca que a BRF deve ser atingida em 4% do lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização. A JBS seria afetada em 1% do Ebitda. No setor de papel e celulose, o Citi entende que o efeito no Ebitda de Fibria e Suzano também seria de 1%.
Abaixo de 1% do Ebitda, o Citi destaca as empresas de autopeças e de aviação. Atualmente, o impacto da contribuição previdenciária desses setores é de 2,5% da receita bruta. “Varejistas e companhias aéreas já disseram antes que são indiferentes [à medida]”, afirma o relatório.
O fim da desoneração para as empresas de tecnologia da informação é um desastre completo para o setor, segundo Benjamin Quadros, presidente do conselho da Brasscom, associação que reúne as companhias do setor. “O efeito dessa medida é o aumento da informalidade, não da arrecadação”, disse. Ele prevê aumento do desemprego. Para a Brasscom, isso pode levar a uma alta de 10 pontos percentuais nos tributos pagos pelas companhias. Em empresas de serviços, a mão de obra representa entre 60% e 70% dos custos.
Segundo ele outros dois efeitos que podem advir da medida é a demissão de funcionários atuais para recontratação de outros com salários mais baixos ou a demissão e posterior recontratação no modelo de pessoa jurídica, ou o chamado CLT Flex (em que uma parte menor do salário é paga no modelo CLT e o restante é “por fora”).
A reoneração pode afetar a retomada dos negócios, avalia Eduardo Borba, presidente para o Brasil da chilena Sonda IT. “A aura de que a crise acabou vai embora e dá uma desanimada em todo mundo”, disse.
O presidente da Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear), Eduardo Sanovicz, voltou a criticar o fim da desoneração. A entidade, que representa Gol, Latam Brasil, Azul e Avianca, calcula em R$ 350 milhões o custo que o setor terá a mais com a mudança na forma de cobrar o encargo trabalhista. Os gastos com pessoal representam 15% dos custos anuais das aéreas brasileiras.
A Avianca Brasil, quarta maior companhia aérea do país, vai perder rentabilidade, disse o presidente da empresa, Frederico Pedreira. “Isso é custo na veia. É claro que vai afetar nossa rentabilidade”, disse o executivo. O executivo disse que a empresa ainda está calculando em detalhes o gasto a mais, mas descartou, por ora, recorrer a corte de pessoal.
Indústria e varejo têxtil e de vestuário afirmaram que a reoneração pode colocar em risco o início de recuperação do setor neste início de ano. O diretor-executivo da Associação Brasileira do Varejo Têxtil, Edmundo Lima, considerou a mudança “preocupante”.
O presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), Fernando Pimentel, disse que o anúncio pegou o setor de surpresa.
A Associação Brasileira de Empresas de Componentes para Couro, Calçados e Artefatos (Assintecal) prevê aumento de 4% nos custos. Considerando toda a cadeia de suprimentos, a alta será de 8%.
A Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados) é da mesma opinião. “Não há dúvida de que a reoneração da folha vai gerar um aumento de custos que terá de ser repassada para preços”, disse o presidente-executivo, Heitor Klein.
A medida pode prejudicar a recuperação do setor eletroeletrônico, segundo a Abinee, associação das empresas do setor. “Estamos iniciando uma retomada da atividade produtiva e da geração de emprego. Mas este cenário ainda é frágil e a reoneração da folha, neste momento, vai tirar o fôlego das empresas”, diz o presidente da Abinee, Humberto Barbato, em comunicado.
Mesmo com noventena, a reoneração pega exportadores de surpresa. Eles precisarão arcar com o custo adicional sem repasses aos preços em contratos já negociados, diz José Augusto de Castro, presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).
Valor Economico, Por Juliana Machado, Rodrigo Rocha, Gustavo Brigatto, Cibelle Bouças, Marta Watanabe e João José Oliveira | De São Paulo