Porto Digital não consegue suprir demanda por mão de obra
“Temos (muitas) vagas”. O anúncio não combinaria com o Brasil de 2019, com seus mais de 13 milhões de desempregados. No entanto, resume o que vive hoje o Porto Digital, no Recife, o maior parque de tecnologia do país. Depois de dobrar de tamanho nos últimos quatro anos, o conglomerado esbarrou na escassez de mão de obra, gargalo do setor de tecnologia da informação no Brasil.
“A gente contrata 500 e no outro dia temos mais 500 vagas para preencher. Os projetos vão migrando para onde a mão de obra está”, diz Pierre Lucena, presidente do Porto Digital. Com faturamento de R$ 2 bilhões, o dobro em relação a 2015, o Porto Digital já emprega 10 mil pessoas. “Se conseguirmos formar mais pessoal, vamos ganhar esse jogo”, diz Lucena.
Em uma tentativa de preencher, de uma só vez, 500 vagas de trabalho – com salário entre R$ 3 mil e R$ 25 mil, o Porto Digital vai promover o que está sendo chamado de “empregaço”. Para tanto, foi criado um banco de talentos que já conta com mais de 6 mil cadastros – hoje, há mais de 1 mil postos abertos no conglomerado de 328 empresas. A maior parte é para programadores, de todos os níveis, e engenheiros da computação.
A demanda por programadores no conglomerado disparou nos últimos anos. Com a mão de obra para o setor de tecnologia praticamente esgotada há anos em cidades como São Paulo, algumas empresas como a Accenture migraram parte de suas operações para o Recife, cidade que tradicionalmente é celeiro de engenheiros da computação e programadores.
Desde 2016, a Accenture já contratou 2,5 mil pessoas para seu centro de inovação no Porto Digital e pretende contratar mais 2,5 mil em dois anos. “Ainda há um distanciamento entre a capacidade de formação de profissionais e as necessidades do mercado”, diz Flávia Picolo, diretora-executiva da Accenture Technology.
Para driblar as dificuldades de contratação, a Accenture diz que fez parcerias com universidades e está capacitando funcionários durante o processo seletivo, antes mesmo de serem contratados.
A barreira da mão de obra não é particularidade do Porto Digital. O setor de tecnologia da informação e comunicação vivencia esse problema em escala global. No Brasil, segundo dados da Associação Brasileira de Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom), se formam por ano 46 mil pessoas em cursos de tecnologia (técnico e superior). Para atingir a meta de dobrar o setor de software e serviços em seis anos, 70 mil profissionais por ano serão demandados ao ano até 2024, na média.
“Mesmo empresas que não são da área de TI precisam se transformar para concorrer com empresas da nova economia. Isso aumenta a concorrência por mão de obra. Os bancos hoje são grandes demandantes de engenheiros”, diz Karla Godoy, COO do Cesar. Centro de inovação de referência, o Cesar está com 100 vagas abertas no momento em virtude de um processo de expansão. “Faz tempo que não temos ninguém para contratar.”
Grandes startups que foram capitalizadas por fundos estão adicionando pressão por mão de obra para conseguirem entregar crescimento mais agressivo. Após aporte de US$ 20 milhões dos fundos Valor Capital Group e Unbox Capital, a In Loco, dona de uma tecnologia de microgeolocalização, está com 100 vagas abertas no Brasil, sendo 90 delas para atuar no Recife.
A empresa, que é a promessa de se tornar o primeiro “unicórnio” do Porto de Digital – startup avaliada em mais de US$ 1 bilhão – montou um plano de remuneração para ser mais competitiva no mercado. O salário inicial, para o cargo de estagiário, é de R$ 2,5 mil fixo mais os benefícios.
Thais Cavalcante, diretora de pessoas da In Loco, diz que a empresa tem ido buscar pessoal em Estados como Ceará e Paraíba, fazendo palestras em várias cidades e abordando ativamente potenciais funcionários pelo Linkedin.
Maior celeiro de talentos da área de tecnologia da informação de Pernambuco, o Centro de Informática (CIN), da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), está no alvo das multinacionais. Antes mesmo de concluir a graduação, Roberto Costa Fernandes, 23 anos, formado em engenharia da computação no CIN, já assinou pré-contrato para trabalhar na Microsoft fora do país. Em outubro, ele vai morar nos EUA ou Canadá.
Um dos fatores pelo qual Roberto escolheu o curso foi a vontade de morar fora, além da afinidade com as matérias exatas. Ele diz que o salário que vai receber “está um pouco fora da realidade brasileira, pois pesa a conversão cambial”.
Enquanto isso, empresas locais têm dificuldade de encontrar profissionais de nível superior. No segmento de inteligência artificial, a Neurotech tem uma média de 30 vagas abertas nos últimos meses. “A gente vai preenchendo e abrem novas”, diz Tereza Helena Cavalcanti, gerente de pessoas e gestão da empresa.
Com 202 funcionários, a Neurotech busca trabalhadores de nível sênior e realiza uma capacitação interna para que eles atinjam maturidade desejada, diz Tereza.
Até o início do próximo mês, a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação do Estado de Pernambuco vai apresentar uma proposta de qualificação de profissionais nas áreas de tecnologia e Tecnologia e Inovação do Estado de Pernambuco vai apresentar uma proposta de qualificação de profissionais nas áreas de tecnologia e inovação. O plano está sendo elaborado pelo Porto Digital e pela UFPE.